segunda-feira, novembro 06, 2006

Um trio ao molho madeira

- Eu e Rodrigo vamos a uma apresentação de choro no Teatro Nelson Rodrigues; você quer ir?

Era sexta-feira à tarde, o show seria à noite. Tive que me decidir rápido. O pior foi esperar pela decisão da Sabrina. Não sabia se ia, se ficava, e o relógio não estava ajudando. Acabou não indo. Eu já estava a mais de meio caminho: de São Cristóvão à Lapa é um passinho.

Fui, e depois fiquei pensando o que teria sido de mim se não tivesse ido. Eu não seria ma mesma pessoa. Alguma coisa mexeu com as minhas entranhas durante aquela apresentação. Mas comecemos pelo começo.

O show não era de um grupo qualquer: o Trio Madeira Brasil é formado por Ronaldo do Bandolim (dizer em que instrumento chega a ser pleonasmo); Marcello Gonçalves, no violão de sete cordas; e Zé Paulo Becker, no violão, e em duas músicas uma viola caipira.

Como falar da qualidade dos músicos a quem nunca os ouviu?
A melhor forma é dizer: OUÇA!

Para que um trio se aventure a tocar Jacob do Bandolim, Egberto Gismonti, Chico Buarque, Edu Lobo, Ernesto Nazareth, e estrangeiros como Manuel de Falla e Astor Piazzola, têm de ter muito giz no taco. E isso só se adquire com muito estudo e muita hora de vôo. Zé Paulo é mestre em Música pela UFRJ; Marcello, formado em Música pela Uni-Rio; e Ronaldo, o decano, membro há vinte anos do conjunto Época de Ouro, mais tradicional grupo de choro em atividade.

Não pude deixar de levar para casa uma parte do show, sob a forma do primeiro disco do trio, epônimo. "Trio Madeira Brasil" é uma breve demonstração do que os três são capazes, e um convite para o próximo disco, a ser lançado tão cedo eles consigam se juntar em estúdio novamente. Palavras deles próprios, que dizem já ter inclusive escolhido o repertório.

É só esperar!

Perto do limite

Odeio quando meu telefone celular toca durante uma consulta. Sempre fico na dúvida sobre se atendo ou não. Depende: ligação de gente conhecida eu deixo tocar e ligo mais tarde; número desconhecido eu geralmente atendo, para saber quem é, e digo logo que estou em consulta e não posso falar.

Odeio quando meu telefone celular toca... mas sábado foi diferente.

Eu estava atendendo uma moça, acompanhada pela filha de oito anos, quando alguém me ligou. Era meu pai. Pedi licença, falei rapidinho. Quando desliguei, a menina disse:

- Que música legal!
- Eu sei que conheço de algum lugar - respondeu a mãe - mas não sei dizer de onde.

O toque do meu telefone é a introdução de "Close to the Edge", do Yes, grupo inglês de rock progressivo. Expliquei isso para as duas.

- Hmmm... sabia! Meu marido adora Yes. Ele escuta isso o dia inteiro.
- É muito bom mesmo! - concluiu a filha.

***

Quem disse que o povo se contenta com pão e circo? Só se for o Cirque de Soleil! Música é mais que diversão, é prazer, e até uma criaturinha de oito anos, com a personalidade ainda em desenvolvimento, já é capaz de perceber a diferença entre Yes e uma bandinha fundo de quintal. Não eram ricos, não eram velhos, não eram nada diferentes de qualquer outro senão no gosto da música pela qualidade, e não pela festa, ou por aparecer no Faustão.